Vozes do Underground
Entrevista com a one-man-band
BLΛCK GOΛT CVLT
O witch house chocou o mundo, talvez antes por sua estética do que por sua sonoridade, e ganhou ligeira notoriedade em 2010 [I] – sendo rapidamente substituído, no trem do hype, pelo vaporwave. Talvez isso tenha sido antes positivo do que negativo – visto que muitos dos artistas desejavam permanecer nas sombras (alguns tinham títulos tão encriptados que mal era possível pesquisar sobre eles) e tampouco tinham grandes interesses econômicos. O resultado? Longe dos holofotes, os oportunistas logo caíram fora e apenas os artistas mais sérios prosseguiram com suas experimentações sombrias – o que em minha visão anticomercial da música evitou que o gênero se tornasse mais ‘leve’ para alcançar as massas.
Devo admitir que não estou muito por dentro do witch house nacional, o que aliás lamento – mas ao conhecer o BLΛCK GOΛT CVLT senti uma grande satisfação mórbida, pois reconheci todos os elementos tradicionais do estilo; percebi estar diante de uma banda que poderia perfeitamente carregar a tocha do witch house adiante. Tive que juntar bastante coragem para conversar com o homem por trás da música, que para minha grata surpresa me recebeu super bem e discorreu longamente sobre a trajetória do cvlto.
GM: Qual é a sua idade???
Gorium: 28 anos.
GM: O Black Goat Cvlt é relativamente novo, teve seus primeiros lançamentos em 2016.
Você teve outros projetos anteriormente???
Gorium: Sempre tentei várias coisas em outras áreas da música. Mas existem três que mantenho até hoje. Gorium (dark ambient/industrial), Halo of the Sun (industrial/ experimental) e o GHOS† GO▲† (witch house) – este último está num hiato.
GM: Você pode dizer, por favor, quando cada um destes projetos teve início???
Gorium:
Gorium: 2007
GHOS† GO▲†: 2014
Halo of the Sun: 2015
GM: Certo.
Você tem atuado sempre só ou já participou de alguma banda/teve outras pessoas envolvidas em seus projetos????
Gorium: Tive algumas bandas com outras pessoas, mas sempre mantive um banda solo como meio de não parar com a música. A banda Halo of the Sun, levo junto com uma amiga e mais um membro nas apresentações [ao vivo].
GM: Com três projetos na bagagem, por que você decidiu criar um quarto, o BLΛCK GOΛT CVLT?
Gorium: Em 2014 fui convidado por um amigo (Hewerton Sarx) para montar o GHOS† GO▲† e esta foi minha primeira experiencia com o witch house, acabei ficando apaixonado pelo gênero e após nossa banda entrar num hiato ainda fiquei na sede por criar mais músicas do tipo. Após dois anos resolvi tentar algo por conta própria, pra tentar sanar aquela vontade de compor coisas novas, e então no inicio de 2016 surgiu o BLΛCK GOΛT CVLT.
GM: O que exatamente te atraiu no witch house?
Gorium: Sempre gostei de fazer música com temática “sombria”, tanto que me foquei em compor dark ambient por muito tempo. Quando fui apresentado ao witch house encontrei neste gênero tudo o que eu já fazia anteriormente, no quesito sombrio, mas com uma batida nova pra mim, que me interessou muito. Logo que aceitei o convite do Sarx para formarmos o GHOS† GO▲† eu me vi diante de um gênero ao qual eu gostaria de me dedicar ao máximo.
GM: Quais foram as primeiras bandas/artistas/projetos que você conheceu?
Gorium: Ritualz (†‡†), Mater Suspiria Vision, White Ring, Salem e CVL† SH‡†.
GM: Quando surgiu em 2010, o witch house atraiu, ainda que ligeiramente, alguma atenção – mas logo voltou a ser algo bastante restrito. Suas páginas na Bandcamp costumam ter poucas informações, aumentando uma certa aura da mistério em torno do cvlto.
As artes são de sua autoria ou de artistas convidados???
Gorium: Não, eu mesmo faço todas as artes. Nos últimos dois LP’s (ΔΛЯҞ ĿĬGĦ† e ΛĿ ΛȤĬƑ) usei fotos de duas amigas minhas e produzi a arte final ΔΛЯҞ ĿĬGĦ†
.
No próximo álbum estou pensando em fazer uma adaptação “live action” de uma ilustração de Gustave Doré, que é um artista que aprecio muito.
GM: Desde o princípio você tem contado com a participação de diversos convidados. Como tem se dado isso???
Gorium: Normalmente convido pessoas com quem tenho uma certa amizade ou alguém em quem vejo um certo potencial inexplorado para a música.
Trabalhamos em conjunto total na criação de cada música, trocando opiniões e ideias para que o trabalho final fique satisfatório para ambos.
Por ser algo que acontece à distancia, devido a todos os convidados até agora morarem em outros estados/cidades, acaba levando algum tempo para finalizar até mesmo uma faixa mais simples, mas sempre acaba saindo tudo bem.
Tenho em mente algumas pessoas para trabalhos futuros, pessoas que admiro dentro do mundo da música, mas por enquanto nada fechado.
https://blvckgovtcvlt.bandcamp.com/track/k-ep-k-feat-sacrelance-single
[confiram o ótimo single Keep looking, com vocais da Sacrelance]
https://blvckgovtcvlt.bandcamp.com/track/v-feat-santa
[escutem a hipnótica faixa ΔϘVƎЯʘП†Ǝ, com vocais de Santa]
GM: Eu pergunto porque facilmente me apaixono por vocais femininos e diante de participações marcantes eu sempre saio em busca de eventuais trabalhos solos – como no caso de Martina Topley-Bird, eterna parceira de Tricky, ou Butterclock, vocalista convidada do oOoOO.
No caso do CVLTO, eu encontrei a Sacrelance, sem dúvida ótima, e também, variando um pouco meu paradigma, o vocalista Santa, incrível – mas gostaria de saber sobre Lolita, que participou do EP W Ï Ŧ Ͼ H B Ï Ŧ Ͼ H.
Gorium: Lolita foi uma participação não planejada inicialmente, eu a chamei para fazer algumas gravações e por fim resolvi incluí-la no álbum. Ela nunca tinha feito algo do tipo e o resultado foi muito interessante, pois mesmo com a simplicidade de sua voz a música ficou melhor do que eu esperava. Diferente da Sacrelance, a Lolita acabou ficando um pouco no anonimato, mas tenho ideias futuras em que gostaria de contar com a participação dela.
Você citou o exemplo da vocalista do oOoOO, realmente quero chamar alguém pra ser meio que fixo em boa parte das minhas músicas e já tenho uma ideia.
GM: Ótimo saber!
BOREAL 2000 foi uma coletânea, certo?
Gorium: A Boreal 2000 foi um grupo que criei, junto com um amigo, pra reunir pessoas que tinham os mesmos gostos dentro da música, com maior destaque para o cloud rap, vaporwave, horrorcore e trap. O grupo foi crescendo e acabamos descobrindo vários músicos, então resolvemos fazer um trabalho maior, posteriormente o Santa e o Diego Betela resolveram montar um selo pra divulgar nossos trabalhos. Foi então que surgiu o Boreal 2000, na posição de selo musical.
A garota da capa: inúmeras pessoas sonham com o estrelato, desejam de algum modo ser imortalizadas pela arte – e embora a TV possa ser o meio de comunicação mais cobiçado, existe um público que considera figurar na capa de um disco como uma oportunidade muito mais elevada. Eu conheci Rokayda em virtude deste fascínio por capas de discos: certo dia eu estava na page no Cvlto e encontrei seu perfil, com a ‘capa do disco’. Não pensei duas vezes: alguém que coloca uma capa do BLΛCK GOΛT CVLT em sua foto de perfil SÓ PODE ser uma pessoa legal. Qual não foi minha surpresa ao descobrir o contrário, que ela era a musa cuja fotografia fora escolhida para ilustrar o álbum! Para além desta distinção, recentemente foi anunciado que o Cvlto contará a participação da moça nos vocais:
GM: Aparecer na capa de um disco é, decerto, uma honra que muitos almejam. Como rolou no seu caso?
Rokayda: Bom, eu havia iniciado minha amizade com o Gorium há pouco tempo, pelo fb, e só nos falamos uma vez, até que em uma madrugada ele veio me perguntar se podia usar alguma foto minha na capa do novo EP, então ele escolheu a foto, editou e eu amei o resultado final – mas confesso que fiquei surpresa com o pedido, fiquei lisonjeada por ter minha imagem relacionada a um projeto tão maravilhoso. Depois disso nós passamos a conversar mais e mais.
GM: No caso, vocês se tornaram amigos naturalmente, pelas veredas variadas do destino, ou justamente em virtude do cvlto?
Rokayda: Bom, nossas primeiras conversas surgiram a partir daí, falamos muito sobre o novo EP, sobre as faixas, e em seguida naturalmente fomos abrindo novos assuntos, não só sobre música mas também sobre o dia a dia, e assim nos aproximamos bastante, tanto é que hoje ele é umas das pessoas mais importantes para mim.
GM: Além de agraciar os fãs com sua beleza sombria, agora você irá celebrar pessoalmente o cvlto: como você reagiu ao convite para ingressar na banda?
Rokayda: Obrigada pelo elogio hahaha, eu fiquei muito surpresa, também um pouco hesitante, porque se eu escolhesse entrar eu estaria assumindo não só os vocais, mas também a responsabilidade, disciplina e o comprometimento com a banda. Tanto é que pedi um tempo para pensar no assunto e o Gorium, como sempre, foi compreensivo. Mas depois de pensar por algum tempo decidi que era isso o que eu queria fazer, me dedicar a algo que eu gosto, então acabei aceitando – e agora estou super feliz com nossas produções. É tudo novo para mim.
GM: E o que você pode nos dizer sobre a dinâmica de vocês, já concluíram alguma faixa?
Rokayda: Os trabalhos estão fluindo bem, estou tentando escrever bastante, gravando, fazendo vídeos, e sim, já temos faixas prontas, porém podemos fazer ajustes de última hora. Gorium e eu somos meio perfeccionistas nas produções, sempre queremos melhorar ou mudar algo.
(retomando a entrevista primária)
GM: Podemos dizer que 2016 foi um ano cheio, com diversos lançamentos. Como você avalia sua discografia?
Gorium: 2016 foi um ano bem surpreendente, varias coisas aconteceram principalmente no culto.
Desde a primeira música que fiz, venho lapidando cada vez mais meu som e deixando naquilo que me agrada. Tenho uma “pira” de que meu trabalho nunca está 100%, mesmo com as constantes melhoras. O EP ΛĿ ΛȤĬƑ foi um marco pessoal, posso dizer que me empenhei muito, além do normal, e o próximo álbum ficará no mesmo nível.
GM: Como você descreveria seu processo criativo? Quais são as etapas de composição e produção???
Gorium: É bem interessante falar sobre isso.
Posso descrever como Emocional e Ritualístico.
A etapa Emocional (composição) vem sempre em momentos inesperados, nunca consigo planejar/criar algo em determinado momento. Eu preciso sentir e expressar aquilo em forma de som e/ou letras, minhas composições fluem dependendo da minha situação mental. Normalmente componho diretamente nos softwares ou com instrumentos físicos (guitarra, violão, violino).
A etapa Ritualística (produção), após compor a base inicial/principal, vou criando a evolução da música. Dentro disso vou sempre fazer quatro coisas, que são praticamente um ritual: primeiro: eu sempre uso os mesmos instrumentos básicos; segundo: normalmente crio alguma arte visual pra complementar a música; terceiro: existe uma pessoa especial que avalia todas as músicas antes de serem divulgadas; quarto: existem, no máximo, 3 versões de todas músicas que já fiz. Após estes passos básicos me sinto pronto para finalizar e divulgar uma música.
GM: Até o momento, o Cvlto tem buscado ficar nas sombras mesmo: é difícil utilizar a grafia correta nas buscas, o que dificulta o acesso. Ao que tudo indica, você não busca as massas.
Gorium: A intenção nunca foi buscar as massas. Acabei optando por aderir à estética rotineira do gênero (uso de caracteres unicode) para permanecer levemente inacessível, no inicio até pensei em usar apenas um simbolo como nome, mas posteriormente vim a desistir da ideia.
Acredito que essa saída para permanecer nas “sombras” ajuda a atrair quem realmente aprecia o trabalho. Infelizmente dificulta o acesso, porém tem seus pontos positivos.
GM: Também é nítido que você não busca fortuna: quando têm preços, seus lançamentos são caríssimos: U$666, U$999 – ao passo que todos os outros são ‘free’ – não são nem ‘pague quanto quiser’.
Gorium: Chega a ser até estranho, não quero atingir as massas e nem ao mesmo lucrar com isso. O que eu quero fazendo música?
Apenas quero um reconhecimento pelo que faço, de maneira sincera. Claro que pretendo futuramente preparar um material com preço simbólico (nada totalmente programado ainda), mas manterei sempre os downloads free. Muitos músicos/bandas que admiro seguem esse caminho, acredito que em parte isso me influenciou. Minhas ambições vão além de apenas dinheiro. Boa parte das vezes, fortuna só traz cegueira.
GM: Quais são suas fontes de inspiração???
Sei que esta pergunta pode parecer muito ampla, mas seria legal saber o que te inspira no geral (outras artes, a natureza) e também na música.
Gorium: Fora questões pessoais, me inspiro muito em coisas que levam um lado mais “obscuro” dentro da música, cinema, literatura, artes plásticas e performáticas. Também alguns temas dentro do ocultismo, sexualidade/fetichismo, sonhos/pesadelos, misticismo e até transtornos mentais.
GM: O que você tem escutado ultimamente???
Gorium: Tem 6 bandas que ando escutando muito. Pharmakon, Morphine, Atrium Carceri, Doom:VS , White Ring e Maldita. São bêm diferentes uma das outras.
GM: Existe alguma banda obscura, nacional ou de fora, que você gostaria de recomendar aos nossos leitores???
Gorium: Existe uma nacional de dark ambient, uma das minhas influências, é o tipo de banda que se mantém no anonimato. São poucos que conhecem a identidade do criador, infelizmente não sou um deles, sua música é interessantíssima e por vezes perturbadora. Minha indicação é o MAIESTI.
https://www.facebook.com/Maiesti/
https://myspace.com/maiesti
GM: O que o futuro reserva para o Cvlto???
Gorium: Esta é uma pergunta que não posso responder.
No momento, estou focado em materiais novos, incluindo clipes.
Mas o cvlto permanecerá mais vivo e intenso do que antes.
GM: Ótimo saber!
Encerrando, só tenho a lhe agradecer pela atenção e pela oportunidade de conhecer melhor sua produção artística!
Alguma mensagem para os fãs???
Gorium: Juntem-se ao cvlto.
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Assista ao primeiro vídeo do Cvlto.
Acompanhem os passos do Cvlto no fb.
Escutem e baixem seus álbuns na Bandcamp.
Conheça outros trabalhos de Santa em sua page na Soundcloud.