[post #26] Entrevista com Semdó, horrorcore nacional

No dia 25 de dezembro o mundo será presenteado com uma caixa de Pandora sombria e ultrajante: o novo full album de Semdó, projeto de horrorcore 100% nacional. Acontece que antes de dirigir todo seu ódio contra a humanidade, Semdó teve uma interessante fase DSBM, com letras misantrópicas, melodias macabras e mesmo um tom atmosférico glacial – além de umas dissonâncias lo-fi de arrepiar. No começo de 2016, como uma espécie de despedida, o artista colocou toda a obra do Lado Oculto para download gratuito – e com o objetivo de contextualizar um pouco esta produção, o Gabinete Musical teve uma longa conversa com o jovem que está aterrorizando a população brasileira.

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GM: Qual sua idade atual???
Semdó: Tenho 18.

GM: Sério? Meu, vocês, jovens, são muito talentosos! Com 18 eu nem saía de casa…
Semdó: Sim hahaha geralmente as pessoas acham que eu sou bem mais velho. Fui meio precoce nessa parada de começar a produzir as coisas.

GM: Estou aqui, diante de sua antiga produção, e se eu tivesse que chutar, diria que seu primeiro lançamento foi o que tem um nome difícil, talvez finlandês?
Semdó: Minha primeira produção? Na verdade não, minha primeira produção foi o álbum Eterno Ciclo Suicida; o Vare Sjeler, pelo contrário, foi a ultima produção do Lado Oculto.

GM: Certo. Qual era sua idade???
Semdó: Na época eu devia ter entre uns 14/15 anos.

GM: E como se deu a produção do álbum? O que você tinha em mente, quais eram seus recursos?
Semdó: Antes desse álbum eu já havia produzido algumas coisas que não foram lançadas, à principio surgiu a ideia como uma necessidade de ter algo produzido pelas minhas próprias mãos, foi assim que surgiu este primeiro álbum. Eu queria expressar aqueles sentimentos e ideias e, de alguma maneira, fazer as pessoas ficarem chocadas. Os recursos eram literalmente muito baixos, eu gravei esse álbum com o microfone de uma webcam hahahaha.

GM: Sim, dá para notar que era bem lo-fi. Você fez tudo sozinho???
Semdó: Sim, eu tinha muito interesse por DSBM na época e já gostava de algo atmosférico e tenso, algo bem carregado.

GM: Eu ia te perguntar sobre isso, a temática está muito atrelada ao DSBM. Que bandas/projetos você escutava na época???
Semdó: Na época eu escutava muito Lamuria Abissal, Thy Light, Xasthur, Uaral (apesar de não ser DSBM), Lifelover, Psychonaut 4, creio que eram as que estavam mais presentes na minha playlist… Hyphotermia também.

GM: Muito bem. A segunda faixa tem guitarra. Você gravou ao vivo ou é sintetizada???
Semdó: Sintetizada.

GM: As demais faixas envolvem algumas colagens com tons mais atmosféricos, como ‘Me guarde bem…’ e ‘Sinta sua mente…’. Da onde veio a inspiração para elas???
Semdó: Teve um dia que eu mandei um áudio, via Vocaroo, pra um amigo, mostrando uma letra que eu tinha escrito, aí ele disse que ficaria muito interessante recitar a letra e colocar algum instrumental junto, fiz o teste e gostei do resultado, tanto que muitas faixas são assim: ao mesmo tempo que são bastante crus, a mera combinação das letras com a atmosfera carregada do instrumental gera um efeito que me agrada muito

GM: Sim, causa um grande efeito no ouvinte.
Você divulgou o lançamento? Teve alguma repercussão na época???
Semdó: A principio só divulguei na minha page pessoal do fb, não havia nenhuma fan page nem nada do tipo, mas já mandei um álbum para a página Avsaknad, conversei com um dos administradores, mas nada além disso.

GM: Certo. Qual foi o lançamento seguinte?
Semdó: Após o Eterno Ciclo Suicida eu lancei o Traga-me o inferno.

GM: Este já tem um instrumental mais elaborado, bem atmosférico, com vocais mais incompreensíveis em contraste com um fundo musical mais tranquilo…
Semdó: Sim, ele foi mais planejado.

GM: Os fundos musicais são originais ou você sampleou algo???
Semdó: Alguns eu sampleei de jogos e outros de filmes, mas apliquei alguns efeitos para soar diferente.

GM: No início soa mais black metal, mas a ultima faixa tem algo de trip hop.
Semdó: Pode crer, eu acho que a última faixa foi uma mistura louca, horrorcore, dark ambient.

GM: Muito bem. Qual foi o lançamento seguinte???
Semdó: O próximo foi Agonia da Alma.

GM: Musicalmente este título é bem variado. Ele tem fortes doses de DSBM, black metal, ambient, mas também tem toques experimentais severos.
Semdó: Sim, é que na real o Lado Oculto nunca foi definido como algo concreto, black metal, DSBM, dark ambient, eu costumo dizer que era música caótica, sem moldes, abrigava muitas influências diferentes.

GM: Em termos pessoais, você estava buscando algo mais sinistro, mais chocante? Como você avalia suas pretensões artísticas à época???
Semdó: Estava buscando algo relativamente “novo” e chocante, diversos gêneros e influências formando uma coisa só, como já disse diversas vezes meu intuito na música sempre foi o caos. Minhas pretensões artísticas eram muito abstratas na época, eu não tinha algo pré definido como “vou fazer dsbm/bm/etc”, era algo mais vago e abstrato.

GM: Ainda sobre Agonia da alma, a segunda faixa tem um dedilhado bastante melancólico. É original ou sampleado???
Semdó: É sampleado de um beat de rap que meu primo produziu, aliás ele tem parte nessa faixa.

GM: Podemos dizer que, à época, você tinha uma mente bem perturbada.
Semdó: Realmente, no começo desse projeto eu estava em um período conturbado, mentalmente falando. O Lado Oculto foi uma manifestação de tudo o que se passava na minha cabeça.

GM: Fazer música, desenvolver isso de um modo artístico, tinha um efeito terapêutico para você???
Semdó: Com certeza, não me ajudava a resolver nenhum problema, mas ajudava a me sentir leve, era um escape, uma forma de expressão.

GM: Certo.
Tudo feito em casa, sozinho???
Semdó: Sim, não tinha dinheiro pra pagar um estúdio, muito menos alguém que se interessasse a produzir junto comigo, então desde sempre fiz tudo sozinho.

GM: Qual foi seu próximo passo???
Semdó: Foi o álbum Eternal Pain.

GM: Na faixa dois, ‘Don’t go now’ , temos mais um dedilhado, agora com um vocal bem sussurrado/urrado ao fundo, algo bem legal e maluco.
Semdó: Esse eu também sampleei de um beat do meu primo, ele disse para eu fazer algo com o sample que eu havia montado, então combinou bastante.

GM: ‘One time for suicide’ é levada só ao piano, quase minimal.
Semdó: Sim, se tu for reparar não são todas as faixas que têm letras, algumas são apenas gritos, sussurros, outras apenas instrumentais, às vezes uma faixa instrumental fala por si só.

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GM: Com certeza.
Depois veio In my darkness???
Semdó: Exato.

GM: Este álbum é mais baseado em guitarras sampleadas, com vocais vagos e bem ocasionais.
Semdó: Sim, todos os instrumentos foram produzidos no Fl Studio, foi algo mais temático, eu queria algo mais atmosférico com guitarras que soassem de uma maneira obscura e suja.

GM: A ausência de vocais, portanto, foi intencional???
Semdó: Foi sim.

GM: E o lançamento seguinte, encerrando um ciclo artístico, foi algo totalmente diferente: Vare sjeler.
Semdó: Sim, ele foi feito todo com sintetizadores, algo mais sereno, obscuro.

GM: Lembra Burzum, pelo tom, mas com outro direcionamento.
Semdó: Nunca tinha analisado assim, mas realmente lembra algumas coisas

GM: Certo.
Neste momento você tinha noção de que estava encerrando um ciclo, que passaria a trilhar outros caminhos???
Semdó: Na real eu já estava trilhando outros caminhos nessa mesma época, o Vare Sjeler foi produzido quando eu estava produzindo meu primeiro álbum de horrorcore, mas eu não tinha noção de que meus novos caminhos tomariam as proporções que estão tomando.

GM: Entendo.
Musicalmente, portanto, você já estava ouvindo outras sonoridades? Como se deu esta transição entre o DSBM e o horrorcore???
Semdó: Na verdade eu já ouvia muito horrorcore quando comecei o Lado Oculto e cada vez fui me aprofundando mais no gênero, quando lancei o ultimo álbum eu já queria trabalhar em algo envolvendo o horrorcore, a transição foi bem natural, quando me dei conta já estava produzindo.

GM: Mas existe uma grande mudança de enfoque: no DSBM introjetamos tons de violência contra nós mesmos, ao passo que no horrorcore essa violência é apontada para fora.
Semdó: Sim, vejo o horrorcore de várias maneiras, principalmente como uma manifestação de ódio abstrato, ódio ao mundo em geral, obviamente não cometi muitas das coisas que cito nas músicas, mas são pensamentos e retratações de coisas que ocorrem, assassinatos, caos urbano, violência acumulada.

GM: Ocorreu algo na sua vida que originou esta virada, algum acontecimento real, ou foi algo puramente intelectualizado, artístico???
Semdó: Comecei a analisar o mundo como um todo, o caos do dia a dia, a violência rotineira, a angustia, a loucura, o inferno na Terra, foi um choque quando comecei a ouvir horrorcore, fiquei fissurado e ouvi durante meses e meses até me propor a fazer, creio que esse choque teve um impacto profundo sobre mim, ocorreram várias mudanças, novas ideias, visões, hábitos, etc.

GM: Você deixou de pensar em suicídio???
Semdó: Não, creio que o suicídio é algo muito presente na vida de quem se atreve a questionar a própria existência, mas não penso em cometer suicídio, pelo menos não tão cedo hahaha

GM: Ok.
Vc já fez, faz ou gostaria de fazer tratamento psicológico/psiquiátrico?
Semdó: Quando pequeno passei por algumas consultas no psicólogo e no psiquiatra por conta de alguns problemas com raiva e ansiedade, mas nada muito grave; hoje não tenho mais essa necessidade.

GM: Perdoe-me pela pergunta, mas você já lançou algo com o Semdó? Se eu estiver certo um EP, não?
Semdó: Na real já lancei bastante coisa sob o Semdó, 7 álbuns e mais 2 participações em mixtapes internacionais – de um cara chamado Chapa Blasfemo, do México, e outra mix de um parceiro da Angola, chamado Skit Van Darken.

GM: Nossa, perdoe minha ignorância!
Semdó: Tranquilo HAHAHA

GM: No caso, estes lançamentos ocorreram entre 2015 e o início de 2016???
Semdó: Os álbuns começaram a sair em 2015/2016, mas os primeiros singles foram lançados no final de 2014.

GM: Pelo que vejo você produz muito. Quanto tempo por dia é dedicado à música???
Semdó: Sempre que estou livre eu procuro produzir algo, letra, alguma melodia pra instrumental, agora que estou trabalhando no novo álbum, que considero “uma nova fase”, estou produzindo praticamente todos os dias desde fevereiro.

GM: Sim, tenho acompanhado bem a produção de D.E.V.I.L.
Sei que seria um equívoco falar demais sobre ele, mas por que você o considera uma nova fase???
Semdó: Por diversos motivos, busco cada vez mais trabalhar com o que gosto, esse álbum está sendo o que mais me dediquei a produzir, tanto em masterização, mixagem, beats, letras, áudio visual, quero começar a me empenhar muito mais nos futuros trabalhos.

GM: Bem, creio que a própria questão do tempo dedicado já demonstra isso, quando observamos que você produziu muitos títulos em pouco tempo e agora temos um ritmo de produção diferente, outra proposta.
Semdó: Exatamente, fiquei um tempo sem gravar nada, passei uma temporada sem microfone e então tirei um tempo para estudar bastante coisa, produção, outros gêneros, isso foi muito positivo, acrescentou bastante.

GM: Mais uma vez tudo em casa, porém com algumas parcerias, certo???
Semdó: Tudo em casa, mas com novos recursos, e sim muitas parcerias novas, sempre contando com meus irmãos da D.S.M.13, mas estou com muitos camaradas somando nesse corre, produtores de grande peso em quem boto muita fé!

GM: Ótimo saber!
D.E.V.I.L. será seu presente de Natal para o mundo????
Semdó: Com certeza, foi um trabalho muito duro, teve toda minha dedicação, creio que vai surpreender muita gente.

GM: O que tivemos oportunidade de ouvir até aqui, realmente, foi muito bom.
Com o Lado Oculto você produziu algum vídeo???
Semdó: Nunca, eu tinha pouca visão sobre áudio visual na época.

GM: Você teve outros projetos além destes dois???
Semdó: Sim, tenho um projeto chamado Desumano com os meus irmãos da D.S.M.13, é um projeto experimental de grind, death, slam, noise, e já tive outro projeto de grind chamado Kaos Crônico, mas acabou.

GM: Desumano é um projeto virtual ou pessoal?
Semdó: Por enquanto é virtual, produzimos os instrumentais no computador, mas temos planos para tornar a banda física em 2017… ou pelo menos tentar UHAEUHAE

GM: Ótimo!
Com o Semdó você já fez apresentações ao vivo,certo???
Semdó: Já sim!

GM: E como você avalia a experiência de estar em público, em contato com os ouvintes???
Semdó: Acho foda, na primeira apresentação o público estranhou um pouco, creio que pela lírica mais forte, mas depois assimilou legal, é uma experiência que desejo viver mais vezes.

GM: Sim, imagino que seja algo intenso mas também problemático, dado o tom misantrópico de suas composições… Algumas são tão pesadas que eu mesmo não compartilho no meu FB, porque podem chocar pessoas menos preparadas rssssss
Semdó: HAHAHAHA entendo como é isso, já me disseram coisas semelhantes, mas isso é uma das coisas que mais me impressiona, tem gente que fica literalmente chocada com alguns sons.

GM: Sim, algumas letras são bem perturbadoras!
Semdó: Eu acho engraçado isso, muitas das coisas que eu abordo nas músicas acontecem no dia a dia e ninguém dá a mínima, quando falo de assassinatos, matança, caos, tem gente que ouve e fica em choque, mas na tv isso é noticiado 24 horas por dia e as pessoas olham de maneira banal.

GM: De fato, hoje em dia isso é muito comum, realmente banalizado, mas as pessoas vêem isso como algo distante e odiável, ao passo que você coloca a si mesmo como alguém disposto a ser este monstro, então isso deixa as pessoas assustadas…
Semdó: Exato!! Tem gente que se questiona se eu faço tudo o que canto nas musicas…
Eu sou só um porta voz hahaha

GM: Bem, creio que isso irá acalmar, temporariamente, a população…
O que você tem escutado atualmente???
Semdó: Muita coisa, ouço muito horrorcore, $uicideboy$, Ghostemane, Gorgoroth, Leviathan, ouço rap nacional, primeiramente, Baco, Febem, é muita coisa pra ser citada, mas ouço um pouco de cada coisa, ultimamente estou conhecendo muitos artistas do meio underground que estão fazendo um som semelhante ao meu, fico horas no soundcloud procurando gente nova.

GM: Ótimo saber!
Algum projeto/banda obscura que você gostaria de recomendar aos nossos leitores???
Semdó: Sim: Abruptum, Pezt, Ghostemane, Narcose, Nuv, Oculto, OmenXIII, GYB, Boreal 2000, Xico Picadinho, Resto de Fetos, Leviathan, Estorvo Beats, Blvck Govt… tem muito mais coisas que me fogem à memória, agora auheuahe

GM: Imagino.
De toda forma, já temos muitas indicações legais até aqui.
Agradeço muito a atenção e lhe desejo grande sucesso!
Semdó: Pô eu que agradeço, curti pra caralho, muito foda esse trampo!

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